segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Muda por opção

Juliana...Ah..Juliana... Era uma dessas ruivas estonteantes de causar inveja a Sophia Loren, suas amigas a chamavam de boca de caçapa, nada além de falar de outrem sabia fazer; os homens só a tinham ao prazer carnal, uma vez que era impossível viver ao lado de Juliana, sempre a falar das mulheres, da vizinhas, sempre a reclamar do sal do bacalhau e do frescor dos tomates; como se uma mulher tão bela necessitasse falar de alguém ou simplesmente falar, sua beleza de bonequinha de porcelana com a pele alva e os cabelos ruivos como o sol já eram falação tal capaz de calar Vínicius e Tom.

Eis que cansada de estar só, Juliana tivera a idéia mais espetacular dos últimos anos, pelo menos era o que lhe parecia, decidiu não mais falar, agora era muda por opção.
Depois de duas semanas arquitetando uma larga e trágica estória Juliana calou-se, calou-se ao mundo, calou-se a si mesma, podando e disciplinando-se no que mais amava: falar mal das mulheres, da vida, da verdura da alface e da vermelhidão do pimentão, pois bem, seu plano estava dando certo, conhecera Augusto, com sua beleza indubitável e muda... sem mais nada os dois se amaram e sem nada saber nem um pio emitia, simplesmente sentia calada sem que uma única nota denotasse seu desejo, seu prazer.

Por fim, os anos se passam, constituem família, mesmo nas dores do parto, Juliana mantêm-se firme no ao seu juramento e nem um gemido na mais alta das dores ela demonstrava.
Augusto tornara-se homem de posses, rico, pai de família, exuberante de um sorriso encantador capaz de arrebatar qualquer pobre coração, mas de um olhar triste, seco e por que não mudo? Por mais que amasse a mulher o abismo imposto pelo seu silêncio o transtornara; necessitava, queria, precisava ouvir gemidos de prazer, gritos de reclamação e por que não uma queixa do azul do céu? Tornara-se surdo no máximo dava ouvidos ao choro do filho pequeno, seu espírito ansiava por dialogar, gritar, amar.

Como era dono de um sorriso absurdamente alvo, desenhado pelos dentistas mais caros, ele conhecera Raquel.; feia, gorda, de maus hábitos alimentares, com varizes pulsando às vistas, um odor que acusava um desleixo com higiene pessoal, mas Raquel falava como ninguém, urrava como nenhuma outra e acima de tudo reclamava, até do alvo sorriso do seu mais novo amante! Como era uma mulher de personalidade forte e matreira impôs que o concubino deixasse a muda.

Augusto o fez, quando o viu sair de casa tinha lágrima a molhar-lhe a face de porcelana; correu atrás, teve impulsos de gritar, tentou com todas as forças, com suas fibras, mas nenhum som emitira, simplesmente esqueceu como fazê-lo.

terça-feira, 22 de julho de 2008

Saudades de outrora


Contar-vos-ei sobre ela, porque fora que sempre cuidou de mim, agora sou eu quem lhe retribuo o favor, lembro-me muito bem quando ainda era diferente,quando ela escondida da minha, da nossa patroa, ou dona, se abraçava a mim, sentia minha pele de algodão, minha fibras finas, doces, suaves que cheiravam, exalavam um cheiro limpo, limpído, uma lavanda única, nunca soubera o que era exatamente, fora criada desde de criança pela patroa, seus pais haviam há muito morrido, lavava, passava, cozinhava, dava um carinho, um verdadeiro, não um comprado ou alugado, aos filhos que nunca foram dela e que nunca conseguira parir, pois os que a vida tentou lhe dar morreram antes de nascer, por fome, por sede,agonizaram em seu ventre, ela podia sentí-los chorando, se agarrando à vida,à ela, o desespero a tomava, grunia fino, abraçada à mim, segurava sua barriga como se tentasse acalentar seus filhos que ela já sabia que não mais viviam, me envolvia em seu corpo, quisera dar meu calor a eles, depois vinha a dor, a dor da certeza, que era de um vermelho vivo, um vermelho que era marcado pelo sangue que escorria pelas pernas, por ter de se despedir de quem já amava, de alguém que nunca conhecera e já tanto sabia; morreram provocando-lhe uma dor que se repetira por diversas vezes, mas de certa maneira lhe fora única... sempre sofreria pelos filhos que nunca pudera ter,mesmo sabendo que nenhum futuro poderia lhes ofertar, mas amor, carinho... por isso amo-a tanto, por isso a envolvo nas noites mais frias, sinto suas lágrimas quentes ao lembrar de outrora, as enxugo, mesmo eu não sendo mais tão jovem, mesmo não tendo o perfume único de antes sou o único que ele ama e somente quem pode amá-la.

A noite caira por completo, não pôde perceber, o que é o tempo para quem não existe? O que é o tempo pra quem o destino escolhera para sofrer? Uma dor eterna de ser a excluída dos excluídos, claro que não é a única, aqui há tantos como ela. Para mim o tempo tem sentido, eu desbotei, perdi a minha cor, hoje tenho o cheiro da velhice, não tenho a beleza da juventude,para mim o tempo passa, me marca, mas para tantos excluídos que aqui vivem o tempo marca a solidão, o tempo não volta, todos daqui sabem, muitos nem passado têm para chorar, para recordar, o que seria uma vida sem nostalgia? E perspectiva de futuro, aqui na selva de pedra, aqui na rua dos excluídos, aqui nas calçadas frias, nos viadutos, a loucura é uma benção, não ter responsabilidade pelos próprios atos, não corar pela vergonha pelo que se é, não corar por perde-se, não corar por estar mais para um objeto não desejado que a um ser humano. Não ter de pedir desculpa por pedir, não se pede pra viver, se pede pra se continuar vivendo.
Não há lugar pra fraqueza, não há lugar pra aqueles que pedem licensa pra ser, aqui somente os fortes sobrevivem, talvez por isso sejam tão invisíveis, porque não existem humanos tão fortes.
Lembro de quando a vi pela primeira vez, sua pela negra, lisa, que reluzia, que tanto contrastava com a minha brancura, sentia sua mão decorrendo sobre mim, um prazer quase humano. Lembro de escutar os gritos infantes, dela largar-me para acalentar as crianças que não eram suas, lembro dos momentos tão só nossos, quando em casas sozinhos sobre a cama, com nossos corpos entrelaçados, meu calor transpassando sua pele,eu sentia sua negritudi, sentia seu prazer ao aconchegar à mim, o calor que se desprendia do meu corpo à alegrar, acho que era amor, mas nunca poderei saber o que é.O que seria o amor?
Mal sabia que sofreria de saudades por aquelas tardes, mal sabia que se tornaria um nada, sem dúvida é mais forte que antes, mas não poderia imaginar onde chegaria? Poderia ter idéia de um destino tão cruel?

segunda-feira, 21 de julho de 2008

Humanidade

Cortado estava... sob aquela ferida jorrava muito mais que sangue, lágrimas que não corriam... Aprisionadas num invólucro carnal, o rótulo frágil guardava uma alma não dura, mas endurecida... pela dor da labuta diária, de tanto sofrer.. tudo secara.. as rugas eram qual um terreno árido, quebradiço e rachado, onde só os seres mais adaptados e fortes sobrevivem... assim é ela.. sobre tudo e todos vive.

Um pus amarelado junto a vermelhidão do sangue q só alguém tão forte pode ter se mesclando à areia criando uma nódoa, forte e dura, onde guardava um ferimento que dói, que abafado doía, uma dor surda, uma dor calada e roxa, forte, corria pelos tendões, pelas terminações nervosas até sua alma. Mas o sofrimento era a única fagulha a alimentar a desgastada fogueira da vida, viver dói. E é a única sinalização à dona dessa alma que ela ainda permanece nesse mundo.

Seu corpo moribundo é iluminado por dois clarões de sanidade, duas bilhas castanhas que demonstram uma força e conhecimento de anos, desse tipo que somente os árduos anos trazem, a sanidade desses olhos me tiraram de meu percurso, me levando aonde minhas pernas por pura inércia poderiam e queriam por vontade própria ir. O fétido odor tirara-me da realidade imposta pela velha moribunda, ou melhor seria, pela rainha caída, pela sábia perdida no chão. Respirei profundamente e minhas entranhas devolveram aos soluços e tropeços o ar impregnado. O espaço quadrado, sujo, perdido e convenientemente esquecido no meio da cidade. Meu corpo se contorce, meus músculos se contraem querendo fugir, há uma batalha entre meu querer carnal e mental, minha alma quer seguir e saber mais...

Fecho os olhos e tiro forças para vencer minha repulsa, giro 180 graus com certa facilidade, pois o corpo quer virar 360 e seguir em frente, relutando, as vibrações provocadas pelo contato de meu calcanhar com o chão deslocam-se em minha perna atingindo minha medula provocando um arrepio, que tento ignorar, que é crescente que anos de evolução me fazem correr, me ausentar de toda aquela dor, de toda aquela doença.

O sol de depois de meio dia projeta a minha sombra em cima da velha senhora que no chão estende a mão fechada a mim, se agarrando aos últimos fios da dignidade, não quer abri-la para pedir, mas seu estômago ruge, suas carnes doem, e assim ela permanece de cabeça baixa, sob minha sombra com a mão em riste, fechada, uma gota de suor que juraria ser uma lágrima deixara seu rosto, batendo no calcinado chão, nessa hora todos os sentimentos, todas as ondas de repulsas se vão, pego em sua mão e puxo em minha direção. Agora de pé a pressão faz com que os coágulos se rompam, toda a dor silenciosa se torna visível manchando o chão de um vermelho escuro de sangue pisado. Ela ainda não olha em meus olhos, um espécie de manta cai deixando seus cabelos marrons a mostrar, lindos, mas manchados daquela vida imunda. De onde é? Eu a indago. Com uma voz fina e quase rouca de quem nunca fala, de quem há muito deixou de existir, rangendo entre as cordas vocais escapa lentamente: Sou do mundo, Doutor. Sua voz impregnada de dor, uma dor que ela não mais sente, chegou a mim , filho de algo, filho de alguém e me fez doer.

Venha comigo. Pela primeira vez ela levanta seus olhos que há tanto me encantaram e mira fundo nos meus, de uma maneira tão intensa e firme que tive medo, vergonha de ser quem era, jurara que poderia dizer tudo sobre mim. Por um minuto ficamos assim, simplesmente assim nos olhando, ela analisava minha alma e diz com uma voz mais dura e segura que antes:

Não.

Mas que tens aqui?
Tenho o mundo. Tenho a minha dor.
E o que ela te traz?
Humanidade.
Humanidade?
Sim. Exatamente isso.
Mas pensas que estás qual um ser humano jogada ao chão?
Estou e sou. Essas últimas três palavras foram tão incisivas que não pude mais argumentar. Meti a mão em meus bolsos, puxei a única nota que tinha, uma de 20 reais a estendi.

Isso daqui nada me serve. Isso aí que me deixa aqui, que te faz pensar que não sou dos seus.

Ela continuou forte, firme e de pé olhando diretamente a minha seca e desnudada alma, pra ela não existia proteção, não havia esconderijo onde poderia ocultar minha vergonha.

Tentei dar um passo atrás, o frio na minha barriga quer q eu fique parado, quase oculto, como se ela não pudesse me ver, reluto e vou-me embora.

Em casa, um pranto forte desce, todas as águas do mundo rolam. Decidi que amanhã a procuraria novamente.

Tenho um sonho confuso com a velha senhora me olhando daquela maneira singular... continua com a mãe fechada, apontada diretamente ao meu coração e vai passando pelo estômago;
Acordo num sobressalto com uma fria camada de suor, não quero comer, já não tenho fome, já não tenho desejo, tudo q quero é saber.

Um verdadeiro vexame, um estado mais que lastimável foi aquele em que me encontrava quando cheguei a repartição em que trabalhava, cuidava de números, de dinheiro de outrem, após uma longa e exaustiva reunião, onde simplesmente abstraíra por completo, pensava, pensava.. tomei um longo banho quente não repleto de prazer e alívio, mas de dor e incerteza, ainda de roupão deitei na cama e observei o teto, mas olhava através dele, como se as madeiras, cimento e tudo mais fosse transponível e vi, podia ouvir as estrelas, elas riam de mim, zombavam de tudo o que eu tinha e mostravam-me que era absolutamente mais que nada.

Aconcheguei-me à cama, cobri-me, dobre-me sobre mim numa posição fetal, buscando o alívio e a proteção que só um útero pode oferecer, adormeci nesse estado, dessa vez não sonhei com nada, pelo menos não me lembrava, mas acordei com gosto de choro na boca, com a sensação do desespero, como alguém que se vê despencando lentamente tentando em vão segurar-se em toda sanidade do mundo. Faz mais de 24 horas que nada como, uma leve tonteira me toma, um frio em toda pele e uma sensação de fraqueza de impotência toma meu corpo.


Atravessara a sala num instante, como num pulo, Tens um cigarro? Nunca fumara, mas sempre vira os amigos estressados consumindo a "fogueada" fumaça como se um bálsamo lhes refrescassem a alma. Na sacada do trabalho a noite escura mostrava sua estrelas que lhe pareciam dentes preste a mordê-lo. (tsc) Acendera o cigarro a fétida "nuvem", fumaça invade sua entranhas, faringe, laringe, traquéia, pulmão, brônquios, bronquiolos, seu corpo revive uma lembrança impregnada há muito esquecida, na realidade adormecida, ele ( o corpo) lembrou que quando o ar o invadiu pela primeira vez, abrindo caminho em sua entranhas, trazendo-lhe vida, trazendo-lhe dor, fazia-o chorar, um choro único, um choro de vida, mas dessa vez não é isso que lhe ocorre, contorce-se , seu corpo usa dessa força primal, expulsando o ar esfumaçado em intervalos rápidos e nada periódicos que lhe implicam em lágrimas, mas não essas do espírito, mas da simples agonia do corpo, hoje a dicotomia entre o corpo e espírito estão mais que presentes, apesar do primeiro sofrer do jejum imposto pelo segundo, estava bem, era um homem saudável, bonito, charmoso, encantava a todos e todas, apesar de não se interessar por qualquer um dos grupos. O nó italiano nitidamente, meticulosamente preparado hoje é um peso, tende sua cabeça à baixo, sufoca-o. Preciso ir!


E foi... andando mesmo, sabia que era longe, mas longe de quê? Não tinha destino, nada e ninguém o esperava, decidira ver a baía, essa de beleza sem igual, mas putrefata, suja, imunda... caminho em torno da orla, observando a própria solidão, olhando pra fora e vendo o seu interior, um vazio resoluto. Tirou o sapato, precisava sentir a gélida areia noturna como ao oxigênio, sentou-se ali mesmo, tinha o nó estrangeiro frouxo o paletó à mão, observava o vai e vem das ondas, ondas escuras de um marrom-esverdeado, percebeu quanto lixo, entulho, quanta matéria orgânica que o mar num movimento eterno expulsava, tudo jogava à praia pra em seguida resgatá-los.

Queria depurar-se, tornar-se puro, nesse momento espelhou-se ao mar, aquelas impurezas eram dele, por mais que tentasse expulsá-las, logo as tinha de volta, num resgate doloroso. Não se pode mudar quem se é! Respirou profundamente.. adormeceu na praia, os primeiros raios de sol o despertaram, mas sentia que ainda dormia, sua visão embaçada, sua mente perdida pelo sono, sua razão ainda não restabelecida parecem se perder quando vêem a mão estendida da velha senhora em sua direção. tenta alcançá-la.. sua visão se aclara e nada... Devo estar enlouquecendo.. Tinha medo que a loucura o tomasse, que a depressão o deixasse num abismo tal que a única saída seria a morte provocada por suas mãos, tinha medo de ir de encontro, contra tudo que a evolução por milênios impôs.. tinha medo de não preservar-se, tinha medo.... MEDO DE TER MEDO.

A ausência de todos os sentidos seriam outros? Não poderia saber se a morte levaria sua dor, ou se simplesmente abriria outras. O mundo poderia ser uma ilusão? Abrira a janela pra sentir o frescor... braços abertos, olhos fechados... se tivesse certeza do fim, pularia sem pensar, mas o receio que a morte lhe trouxesse novas questões era um peso grande demais... queria esquecer tudo. Desejava ardentemente por uma lobotomia... queria não pensar, queria não ter dúvidas, porque a inexistência de perguntas, de questões, seriam simplesmente a certeza da não existência.

No fundo não se pode descer mais, um impacto seco o levara

Dormiu um sono pesado, sentia-se seguro, aconchegado e quente. Acordou feliz, não sabia o porquê, quando saiu do banho e olhou-se no espelho percebeu quanto tempo passara desde que olhara sua imagem, um choque momentâneo, a imagem esculpida na tela não era dele, um senhor barbado...
Pensou que deveria buscar um médico, talvez sofresse de uns desses transtorno tão em moda.
A água descia por sua garganta abrindo-lhe caminho, o seu frescor contrastava com o calor que sentia, comeu, comeu como em poucas vezes na vida, sentia-se satisfeito, repleto e cheio. Fez dinheiro como só ele sabia, mesmo não sabendo o porquê de fazê-lo, vendeu o que ninguém precisava, convenceu quem não precisava ser convencido, tinha um sorriso estampado no rosto e um calor que vinha das entranhas.

Amigos não tinha, se mais colegas, nunca chegados a ele, o convidaram por mera educação e assim foram beber... A luz vermelha refletida em sua pele tornando-a especial, a cerveja gelada, descia suave levando consigo dores e cansaços cotidianos... as risadas e falas pastosas escorrem pelo seu canal auditivo provocando gargalhadas sem motivo... sente-se feliz, não lembra mais de nada... Seu olfato é a única sensação que o corpo lhe permite, a visão está turva, o mundo gira, não pode distinguir os sons, sente um cheiro, cheiro de vida, um cheiro alcalino... cheiro de muitos, suor, corpo, sente uma ardência finita, um beijo consolável, sente um calor... que desprende-se das entranhas a um corpo úmido, morno que o toma, que o doma como se fosse um animal assustado, afinal de contas era o que era.

Acorda com um gosto amargo na boca, o cheiro forte, alcalino entra em suas narinas, transpassa suas mucosas e causam um arrepio, um certo nojo..... está nu, um fino lençol o cobre, levanta a cabeça, seu estômago gira... uma voz suave, quase infante lhe diz - são 27 reais, vira-se rapidamente vê a jovem, sua pele morena, seus olhos claros, seus cabelos secos... lindos, caindo sobre os seios jovens, pequenos e duros... quando se restabelece percebe a pouca idade da senhorita, nota a cama suada, repleta de humores, fluidos de outrora... o quarto fede... olha dentro daquele olhos inocentes, mira aquela carne tão dura, tão jovem.... sente pena...

Tira tudo que há em seus bolsos... suas mãos trêmulas deixam cair moedas que tilintam rasando o vazio, o silêncio entre os dois, ele (o silêncio) se restabelece, tem as mãos estendidas repletas de notas amassadas, emaranhadas e a cabeça baixa, a meninas desliza suas pequenas mãos entre as deles levando consigo todo o conteúdo.

Caminhando um chuva fina de um céu cinzento, o incomoda como se infinitas agulhas caíssem do céu, nesse momento fecha os olhos, e caminha, sua alma sabe de todos os buracos, de cada curva e desnível, mas não soubera nada sobre ele, de olhos fechados invoca a mais terna lembrança, o seu primeiro amor, o seu primeiro estado de raiva, o ódio mais intenso e nada vem... nesse momento percebera toda a realidade, percebera que era seco, inócuo, incapaz de amar, entende a verdade da senhora, entende o que tanto lhe atraíra .. era a sua humanidade... abrira os olhos a vê em sua frente com sua feridas a amostra, com o sangue manchando o chão, com as feridas purulentas a impregnar a tudo com o cheiro de podridão... nesse instante a abraça, seus lábios tocam levemente aqueles tão sujos, tão relegados, tão perdidos.. ela entra por sua pele, por seus poros, tomas sua vênulas, veias, artérias alcançando enfim seu coração...tornam-se uno. O que não pudera perceber, pois estava olhando com os olhos d'alma e não com os do corpo era que estava de joelhos chorando em meio de um grande cruzamento, era um choro de emoção, era um choro humano, era um choro por estar completo, estava cego pela emoção e dessa maneira é que mancha todo o chão, é que choca a todos o pedestres quando seus restos, seu sangue, suas entranhas, seus ossos moídos são atirados ao longe pelo grande caminhão de lixo, os outros só podem nausear, só podem ver as vísceras,só podem ver a vermelhidão que inunda o asfalto, nós que a tudo vemos e que tudo sabemos, conseguimos ver um sorriso em seus ternos lábios, sua alma brilha, radia um brilho único que só alguém completo poderia ter.